A economia que eu tanto amo
/(como funciona a economia, do local ao global)
Te apresento a Mariana.
Mariana é designer freelancer em Florianópolis, SC.
Nos últimos meses, a Mariana vem recebendo o dobro de trabalhos. Ela aumentou seus preços, por causa da demanda, e mesmo assim ainda não dá conta de tudo que tem pra fazer. Tá desenhando 16 horas por dia (e muito feliz, pois agora tá trabalhando com o que ama, e ganhando um bom dinheirinho).
Ela vem recebendo muitos trabalhos, porque um dos seus clientes é a DeepWeber, uma empresa de desenvolvimento, também de Floripa.
Eles acabaram de receber um investimento da FundRaiser, um fundo de São Paulo. E com a grana, conseguem alavancar as vendas, e precisam de mais e mais gente trabalhando.
O escritório já tá cheio de gente, e eles partiram pra contratar trabalhos de designers freelancers, como a Mariana, pra dar conta de tanto trabalho.
O investimento da DeepWeber apareceu por causa de um estudo, feito por economistas, de que Santa Catarina é o primeiro estado em densidade de Startups no Brasil.
Este estudo inclusive foi divulgado por outros economistas famosos, fazendo o assunto ser comentado no Brasil inteiro.
Isso chamou a atenção da FundRaiser, que veio até a cidade e encontrou bons negócios pra investir. Estes investidores arriscam seu próprio dinheiro, e colocam ele na Deepweber, pra fazê-la crescer, se tornando sócios do negócio. Se tudo certo e a empresa realmente crescer, eles participam dos lucros.
Com o crescimento da DeepWeber, mais alguns fenômenos acontecem: dois ex-funcionários, vendo uma nova oportunidade, viraram sócios e abriram sua própria startup. E eles vão precisar de mais funcionários, mais freelancers… e em breve podem ir atrás de um investimento, e recomeçar esta história.
Paralelamente, outras empresas também começam a surgir, justamente pra atender a demanda que a DeepWeber vem criando - eles precisam de treinamento, advogados, consultores, contadores, programadores, designers, manutenção e limpeza, comida, café, entregas… todos vão acabar tendo um aumento de trabalho (e vendas, claro), por causa do crescimento.
E eles não são os únicos. Mais investimentos vêm chegando.
A cidade vem ganhando novos eventos, como Startup Weekends e "summits" de todo o tipo, incentivando o mercado a crescer, gerar novos negócios e fazer crescer os que já existem.
E quem ganhou com tudo isso, no fim das contas??
A Valéria.
Não sabe quem é a Valéria? Ela é faxineira da casa da Mariana.
Com toda essa trabalheira, a Mariana não tem mais tempo pra cuidar da própria casa, e do próprio jardim. Mas tem dinheiro no bolso pra contratar pessoas que façam isso pra ela.
E a Valéria, trabalhando, compra mais nos mercadinhos do bairro dela, que compram mais no distribuidor, que encomenda mais das fábricas, que acabam encomendando mais matérias-primas.
Inclusive, na hora de transportar esse produto todo, acabam dando mais trabalho pra DeepWeber, que desenvolve justamente os softwares de carga usados pelas distribuidoras de alimentos.
Sem saber, a Valéria tá ajudando no crescimento da Mariana.
Falando em matérias primas: uma das coisas que a Valéria compra no mercadinho é presunto Sadia.
Aquele, cheiroso e rosadinho, sabe?
Se a Valéria consegue comprar mais presunto, porque agora ela tem mais uma cliente (a Mariana), isso é bom, no fim das contas, para a Sadia, né?
Como o mercado vem crescendo, em virtude das novas empresas e novos investimentos, várias “Valérias” vão surgindo, com mais clientes e mais dinheiro no bolso.
E as vendas de presunto aumentam.
O supermercadista vê que o presunto tá vendendo mais, e aumenta o número de presuntos comprados a cada pedido. Isso se reflete lá no balanço da Sadia, que vê um aumento nas vendas.
E, por ser uma empresa de capital aberto, a BRF (empresa que é dona da marca Sadia) tem que publicar seu balanço, trimestralmente.
É aí que entra o Marcelo.
O Marcelo, de Cuiabá, tem um dinheiro e quer multiplicar o capital. Investir, sabe? E ele vai estudar várias empresas, pra saber qual tem mais possibilidade de crescer e valorizar o investimento dele.
E acaba encontrando justamente o balanço da Sadia (veja, que coisa!), que registrou um aumento de vendas nos últimos meses (lembra?).
Lendo um relatório econômico, o Marcelo descobre que a economia vem crescendo, com valorização constante das empresas de alimentos.
Ele entra no site de uma corretora, digita BRF3 (o código pra comprar ações da Sadia), e coloca seu dinheiro lá, comprando partes dessa empresa.
A compra do Marcelo não é a única, já que mais gente também vê o crescimento da Sadia, e compra ações também… o que faz o preço dela subir.
E se o mercado vê que o valor de uma companhia está subindo, a tendência é que mais pessoas acompanhem o movimento, comprando mais ações para terem lucro. Isso faz a Sadia crescer, de dois lados diferentes: de um lado porque aumentaram as vendas, do outro porque as pessoas estão a enxergando como uma empresa lucrativa.
E empresa lucrativa cresce. E contrata mais, pra poder vender mais. Contrata pessoas que vão pegar seu novo salário e gastar, fazendo esse dinheiro circular.
"Maldito capital especulativo”, né? Claro que não!
Sabe onde isso vai se refletir? No tal “Índice Bovespa”.
Chamado de IBOVESPA (criativo, né?), este índice nada mais é do que uma conta (matemática, mesmo), que leva em consideração várias empresas brasileiras.
E a Sadia (BRFS3) é uma delas: responde por 2,608% do IBOVESPA. Quando ela vai bem, influencia o índice a subir. Se ela vai mal, influencia na queda.
Legal, né??
Sabe quem mais pode influenciar no IBOVESPA?
As Lojas Renner, onde a Valéria compra roupas;
As Lojas Americanas, onde ela compra a TV nova pra ver a Copa do Mundo;
A Ambev, da cervejinha (seja ela Hoegaarden ou Antarctica Sub-Zero);
A Natura, do perfume e do sabonetinho;
A Droga Raia e a Drogasil, que vendem os remedinhos;
A TIM, que.. bom, você sabe o que faz a Tim;
A Braskem, que participa das embalagens e rótulos pra quase tudo que se tem em casa;
A Hypermarcas, que faz a camisinha Jontex, o algodão York e o shampoo Monange, que ela usa. E o desodorante Três Marchand, que o marido dela adora. Sem esquecer do Biotônico Fontoura que ela dá pro filho, e o Atroveran que ela toma pra cólica;
A JBS (meu Deus, até eles??) que faz a margarina Doriana, o sabão Minuano e o peru da Seara, que vão comprar para o Natal.
Quando estas empresas vão bem, o valor de mercado delas sobe, e isso faz o IBOVESPA subir. E, para estas empresas estarem crescendo, elas precisam estar vendendo mais, não é?
E assim, a roda gira.
A economia não é um animal selvagem sem rosto, tipo o Chupa Cabras. É só a soma de cada transação comercial feita, por cada ser humano que vive em sociedade.
Uma vez que você desmistifica isso, e tira essa máscara, vai ver que o assunto é mais simples do que você pensava (e menos assustador).
Eu poderia começar a história novamente, reescrevendo do ponto de vista de qualquer um dos personagens. Mas eu deixo pra você, que tá lendo. Experimenta!
Vou ajudar a começar. Pode ser assim:
"As ações BRFS3 subiram, o que refletiu num aumento do IBOVESPA. Isso aconteceu por causa de um aumento no consumo de presunto Sadia, que foi causado por… "
O resto é com você.
Um abraço!
Leandro Benincá
PS: Antes de comentar, tente entender as minúcias. Perceba que são exemplos para ilustrar uma explicação. ULTRA-didático e ULTRA-simplificado… tipo “economia para pré-escola”. Não seja idiota.
PS2: Este post é uma tentativa de explicar como a movimentação do índice Bovespa reflete a movimentação na vida de todas as pessoas economicamente ativas do Brasil, da forma mais simples e didática que eu possa imaginar.
PS3: O título é pura ironia.
PS4: E eu posso ter deixado escapar algumas doses de ironia e sarcasmo ao longo do texto... as vezes não consigo evitar.
PS5: Repito: não seja idiota.